Seres da Natureza

Brasília, dia 30 de março. Brasília é concreto e é cerrado. Eis o paradoxo do planalto central. No centro a moderna civilização. No entorno a vida primitiva dos seres da natureza. E a harmonia se equilibra em pontas de cristais submersos.   

Longe na Memória

Brasília, dia 29 de março.

De Passagem

Brasília, dia 27 de março. Aterrissou no Plano Piloto da capital às 11 horas. Bom dia, muita chuva, e por lá, calor abafado, sabe como é, blá, blá, blá, negócio fechado. Às 4 da tarde esperava a chuva passar olhando o Museu Nacional pela janela. Cinza, vento, relâmpagos, trovões. Acabou a luz, acabou o telefone. Mas esse temporal passa hoje? Pingos. Pingos. Pingos. Parou a chuva. Corre e pega um lugar na Asa Sul. A cidade decola e leva o visitante embora.

Dor da Noite

Brasília, dia 25 de março. E ela se agarra na gente como se a gente fosse o alimento necessário a sua sobrevivência nessa cidade. E ela cerca a gente. E ela apaga as luzes dos postes, abafa os sons da rua e derrama um temporal de repente. E a gente se encolhe, se assusta, olha pros lados desconfiado, anda rápido. Mas finalmente a gente sente o abraço desesperado da noite como fazem aqueles vampiros que não controlam sua pulsão pelo sangue dos outros.

Entremundos

Brasília, dia 24 de março. Depois de um tempo nesta cidade, correndo por suas veias, escondendo-se nos seus breus, molhando-se na sua chuva, a cidade entra na gente e a gente entra na cidade, e não tem mais jeito de se desvencilhar.

Notívago

Brasília, dia 22 de março. Profissão: escritor. Identidade: desconhecida. Peso e altura: duas roupas e um guarda-chuva. Timbre de voz: não se ouviu. Quando na rua, ele se encolhe na imaginação. 

Sobre o Dilúvio

Brasília, dia 17 de março. Foi anunciado. Prédios implodiram. A cidade ficou horizontal. A água não corre nem para um lado nem para o outro, equilibra-se no planalto central. E a cidade escorre por cima da água.

O circo não chegou

Brasília, dia 12 de março. Malabares, monociclos e chamas circulam pelos principais semáforos da cidade. Diziam que os palhaços tomariam as ruas, que os circos chegariam. Mas palhaços não riem. E a cidade ficou iluminada e triste.

Beatriz

Brasília, dia 9 de março. Beatriz sonhou que atravessou a rua na frente daquele carro. Mas ela não conseguia enxergar quem estava dentro. E ficava angustiada. No sonho ela parava no meio da faixa de pedestre e encarava o parabrisa, a visão ofuscada pelos faróis. Mas no dia seguinte, quando ela voltava pra casa e, assustada, percebeu o fato se repetir, não teve coragem de olhar o carro. Sentia que a olhavam.

Litoral

Brasília, dia 8 de março. Toda vez que o mar vem é isso. Crescem coqueiros em segundos. Paira o sol poente sem se pôr. Brasiliários correm na mesma direção. Até que pára a brisa, some a maresia. Volta o cerrado.

Fugir da cidade

Brasília, dia 6 de março. Os prédios implodem. Desta vez sem aviso.  A cidade será varrida de novo. Brasiliária foge da transformação em pressa disfarçada.

Sinal Fechado

Brasília, dia 4 de março. Um irá atravessar a rua. O outro não. Um irá olhar para trás. O outro não. Um irá se molhar na chuva. O outro não.

Quando esqueço como foi o dia

Brasília, dia 3 de março. Souto pensou em correr. Brasas podiam cair. Mas qualquer abrigo ficava a duas longas pistas dali. A cidade é aberta. Souto andou devagar. O céu se acalmou.

Brasília 18h

Brasília, dia 1° de março. A cidade girou mais uma vez. Acontece sempre que grandes grupos de brasiliários pisam com mais força sobre a faixa de pedestre da Rodoviária. Ela fica em cima do Eixo Monumental.

Brasília em Movimento

Brasília, dia 25 de fevereiro. O mundo mexeu. A cidade segurou mais firme seus alicerces e lançou suas nuvens, como ondas, cobrindo um dia que deveria terminar mais cedo. O organismo vivo de Brasília se deslocou a sudoeste, com impaciência. Os cristais subterrâneos balançaram mas não saíram do lugar.