Crepúsculo
Brasília, dia 20 de novembro. Noite e dia não vão se misturar no céu de Brasília. Sol e chuva, como água e óleo, disputarão o espaço na mistura heterogênea do horizonte. E não haverá escuridão absoluta. E raios e trovões vão balançar a cidade mas não lançarão todos os temporais. O meio tom estranho entre a não-escuridão e a não-claridade cegará mais uma vez os Brasiliários em todas as ruas, em todos os carros.
Rio Monumental
Brasília, dia 18 de novembro. No dia seguinte o Eixo Monumental será o leito raso de um longo rio. Os Ministérios, suas margens, que o conduzirão por cima do Congresso Nacional, passando veloz em frente ao Palácio do Planalto, levando consigo o Panteão da Liberdade para desaguar no oceano do Lago Paranoá, ligando finalmente a cidade de Brasília ao mar.
Depois daquela Aula
E a Nave Pousou
Brasília, dia 14 de novembro. Na terra plana e molhada, outrora ocupada por seres de antigas civilizações, o que diria Clarice, ao ver surgir de repente a nave branca e gigante do Museu Nacional de Niemeyer? A porta que se abre e os líderes que começam a desembarcar. Brasília é um aeroporto. E todos estão de passagem.
A Biblioteca
Brasiliários
Brasília, dia 12 de novembro. A cidade paisagem se torna superpovoada como pedia Clarice. Candangos convergem de volta à rodoviária do Eixo Monumental e serão distribuídos às pressas para suas cidades-satélite. Eles voltam para a periferia que passaram a ocupar depois que terminaram de construir a capital. "Em Brasília estão as crateras da lua."
No Horizonte
Brasília, dia 11 de novembro. Construção com espaço calculado para as nuvens. Cidade que se deita no horizonte. Essa beleza assustadora, essa cidade traçada no ar. Brasília fica à beira. Aqui criança não pode ficar de pé porque senão cai. Cai pra fora do mundo. Em cima da rodoviária, na via que cruza o eixo monumental, candangos aguardam o ônibus para casa, ao fim do expediente.
Tudo parece longe
Brasília, dia 10 de novembro. Além do vento há outra coisa que sopra. Algo na crispação sobrenatural do lago. Aqui o ser orgânico não se deteriora, petrifica-se. A natureza floresce gélida. Este grande silêncio visual. Clarice Lispector escreveu: "Se tirassem meu retrato em pé em Brasília, quando revelassem a fotografia só sairia a paisagem." Há uma hora incógnita em que o maná desce e umedece as terras de Brasília.
Os Passeadores
Brasília, dia 9 de novembro. Brasília era habitada por homens e mulheres que faiscavam ao sol. Eram todos cegos. Os brasiliários viviam cerca de trezentos anos. Os pés que não tocam a terra. Uma cidade traçada no ar. A alma aqui não faz sombra no chão. Em Brasília não há por onde entrar e não há por onde sair. O acaso aqui é abrupto. Brasília é mal assombrada. A beleza de Brasília são suas estátuas invisíveis. Clarice Lispector respondeu: "Quando morri, um dia abri os olhos, e era Brasília".
O Atravessador
As Ruas
O Templo
O Observador
Encontro Marcado
Sombras e Medos
Brasília, dia 31 de outubro. Catedral Militar Rainha da Paz. A outra catedral da capital. A referência de entrada para o sudoeste. Passe pela frente todos os dias. Quando o sinal estiver fechado, você será obrigado a ficar parado, observando. Será sempre noite. A luz virá do chão. Os carros apertados na frente vivem dizendo que tem muita gente lá dentro. Mas você não verá ninguém.
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